sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Conceito de acto administrativo impugnável

Tendo em conta, a seguinte afirmação " No entanto, o conceito processual de acto administrativo impugnável é diferente de acto administrativo, sendo, por um lado, mais vasto e, por outro mais restrito", importa fazer um devido enquadramento dogmático:
A acção administrativa especial é uma forma específica de processo, que refere o modelo de tramitação a seguir no momento da propositura da acção, no seu desenvolvimento posterior bem como no momento da decisão final pelo juiz e compreende regras diferentes para as quatro modalidades que integra, nomeadamente: anulação de um acto administrativo ou declaração da sua inexistência (artigos 50º e ss CPTA); condenação à prática de acto administrativo legalmente devido (artigos 66º e ss CPTA); declaração de ilegalidade de normas regulamentares ilegais (artigos 72º e ssCPTA) e declaração de ilegalidade pela não omissão de regulamentos (artigo 77ºCPTA).
Por conseguinte, cabe debruçar-nos sobre o conceito de acto administrativo impugnável (artigos 51º a 54º CPTA) que é um dos pressupostos processuais específico e fundamental da acção administrativa especial na modalidade de anulação, a par de outros pressupostos como a legitimidade (artigo 55º a 57º CPTA- técnica repititiva do artigo 9º e artigo 10ºCPTA) e a oportunidade(artigo 58º CPTA).
Desta forma, é importante referir que a teoria do acto administrativo impugnável está intimamente associado às diferentes formas de Estado respectivamente ao Estado totalitário, em que o Estado gozava de grande liberdade e em que os actos administrativos de "polícia" eram o modelo típico de acto administrativo, uma vez que existiam privilégios exorbitantes da Administração. Em Portugal, esse modelo "encaixava-se" na Constituição de 1933 em que o acto administrativo é considerado definitivo e executório.
Mesmo com o surgimento do Estado Liberal que corresponde à Administração Agressiva, o acto administrativo continuou com as mesmas características; atente-se à construção de Marcello Caetano do acto administrativo como definitivo e executório manifestação "por excelência de autoridade da Administração", enquanto actuação administrativa "que obriga por si e cuja execução coerciva e imediata permite independentemente de sentença judicial".
Após, com o aparecimento do Estado Social que por sua vez, está ligado à ideia de uma Administração Prestadora verificou-se uma transformação do entendimento de acto administrativo, na medida em que este deixa de ser a única forma de actuação administrativa.
Por último, com o Estado Pós-Social associado já à ideia de uma Administração Infra-Estrutural os actos administrativos adquirem uma eficácia multilateral, pois os destinatários e todas as outras pessoas são afectadas pela emissão desses acto.
Contudo, com a revisão constitucional de 2004 o conceito de acto administrativo definitivo e executório é totalmente afastado criando deste modo, um novo modelo de justiça administrativa através de um conceito amplo e aberto de acto administrativo como qualquer acto produtor de efeitos jurídicos a nível individual e concreto que se encontra susceptível de ser impugnado, desde que provoque uma lesão ou afecte imediatamente posições subjectivas dos particulares.
Saliente-se, que esta é a posição defendida pelo Professor Vasco Pereira da Silva afastando-se,assim, a noção restritiva de acto administrativo seja ao nível substantivo seja ao nível processual.
Sendo assim, cabe analisar o disposto no artigo 51º CPTA que nos diz que são impugnáveis actos administrativos com eficácia externa" e que sejam "susceptíveis de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos"; estes dois critérios são autónomos que existem para situações jurídicas diferentes, basta olharmos para o artigo 54º CPTA que admite a impugnação de actos administrativos lesivos sem eficácia externa.
De acordo, com o Professor Mário Aroso de Almeida, o elenco decisivo de acto administrativo impugnável é a eficácia externa que "tem apenas que ver com a natureza (interna ou externa) dos efeitos que o acto se destina a produzir na esfera jurídica de qualquer entidade, privada ou pública, em condições de fazer com que elas possa resultar um efeito útil da remoção do acto da ordem jurídica", daí o Professor dizer tratar-se de um conceito muito amplo que necessita de um denominador comum: a eficácia externa.
Em contrapartida, o Professor Vasco Pereira da Silva vem referir que o critério da eficácia externa não é o "critério-mãe" do acto administrativo, logo o critério utilizável é o da lesão dos direitos dos particulares. Trata-se de um novo conceito de acto impugnável que contém ora um pendor objectivista (eficácia externa), ora um pendor subjectivista (acto lesivo dos direitos dos particulares) afastando definitivamente a definitividade horizontal, consagrando agora o legislador uma opção ao particular que nunca é prejudicado por impugnar no início ou no meio do procedimento, isto é, não há nenhuma obrigatoriedade de impugnar o acto administrativo em determinado momento do procedimento.
Por fim, cabe concluirmos que a afirmação do Professor Vieira de Andrade onde nos diz que o acto administrativo impugnável é mais vasto que o conceito de acto administrativo é devido ao facto de não depender da qualidade administrativa do seu autor (artigo 51 nº2 CPTA), já referido supra pelo Professor Mário Aroso de Almeida, enquanto o acto administrativo já exige a qualidade do seu autor, mais respectivamente órgãos da administração. Por outro lado, é mais restrito que o acto administrativo porque apenas abrange decisões administrativas com eficácia concreta , incluindo os actos destacáveis e excluindo os actos internos.
De facto, sendo a finalidade da impugnação dos actos administrativos o controlo da invalidade é de notar, a divergência doutrinária no que toca ao conceito amplo e restrito de acto administrativo impugnável uma vez que a regência define actos administrativos como "todos aqueles que produzem efeitos jurídicos mas, dentro, aqueles cujos efeitos sejam suceptíveis de afectar, ou causar uma lesão a outrém, são contenciosamente impugnáveis" adoptando uma visão ampla; todavia o Professor Vieira de Andrade fala-nos num conceito vasto de acto administrativo impugnável na sua dimensão orgânica mas também num conceito restrito devido à sua eficácia externa.

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