segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Depende

Nada no seio da Judicatura é pacifico. A visão sobre um mesmo aspecto varia inevitavelmente dependendo do olhar do observador. A doutrina diverge e oscila, vogando ao sabor de doutas opiniões consoante a ideia que se tem por base de um sistema em geral ou de uma só questão em particular.
No que ao acto administrativo diz respeito não é diferente.
O artigo 120º CPA estará correcto ou incorrecto dependendo do conceito mais amplo ou mais restrito que se adopte, assim como do acto administrativo impugnável, patente no artigo 51º CPTA. Qual será a diferença entre os dois conceitos? Haverá uma posição correcta e outra menos certa?

Depende.

De um lado, o ponto de partida far-se-á pelo conceito de acto administrativo material, ele mesmo contido no 120º CPA, porque se vê a função de impugnação do acto administrativo como um controlo de invalidade ; são decisões materialmente administrativas de autoridade porque produzirão efeitos numa situação tida como individual e concreta, e assim serão considerados independentemente da forma que revistam. Significa que tudo o que não seja decisão não caberá neste âmbito uma vez que não existe a produção de efeitos na esfera dos particulares. Daqui, se faz o contraponto entre acto administrativo e acto administrativo impugnável, em que este último seria mais vasto e simultaneamente mais restrito, mesmo que tal possa parecer aparentemente paradoxal ; seria, então, mais vasto, na sua dimensão orgânica, em que não há dependência da qualidade administrativa do autor do acto para a sua impugnação, significando que abrange actos emitidos por autoridades que não se integram na Administração Pública. Seria, também, mais restrito porque se tem em conta a eficácia externa, especialmente a eficácia que se traduza na lesão de interesses e direitos legalmente protegidos, dos particulares. ( Prof. Vieira de Andrade )
Aqui, a eficácia externa e a lesão de direitos e interesses seriam como irmãos siameses, no sentido de inseparáveis, como requisitos cumulativos para a impugnação do acto.

De outro, uma visão que contém duas noções : uma visão mais abrangente, a que está vertida no corpo do artigo 120º CPA, como decisão que produza efeitos jurídicos em sede individual e concreta, e outra mais restrita, já relacionada com a actuação autoritária da Administração, correspondente, por si, a um meio processual, o recurso de anulação, que com a reforma é substituído pela noção, esta sim, ampla de acto, em que se abrange a actuação da Administração como prestadora e das entidades privadas dotadas de poderes públicos. Serão estas também susceptíveis de impugnação para a tutela dos direitos e interesses dos particulares. ( Prof. Vasco Pereira da Silva )
Aqui, a lesão de direitos e a eficácia externa separam-se conforme a pretensão, se de defesa de direitos ou defesa da legalidade.

Depende.

A ideia plasmada no artigo 51º CPTA será a conjunção de dois requisitos fundamentais, a eficácia externa do acto, e a ideia de lesão de direitos e interesses. A ideia subjacente às palavras do legislador, e numa lógica subjectivista, seria sempre o direito e interesse do particular, estaria sempre em primeiro lugar a defesa deste conceito.
Ora, se surge a eficácia externa, como produção ou constituição de efeitos nas relações jurídicas administrativas externas, como requisito essencial, forma-se como que uma dupla protecção : protegem-se os interesses e direitos dos particulares e a possibilidade simultânea de esses interesses poderem vir a ser atacados pelos actos externos da Administração.

Depende, dirá o jurista avisado. Nada no seio da judicatura é pacifico.

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