quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Comentário à 2ª tarefa

De referir em primeiro lugar que o conceito de acto administrativo nunca foi uniforme de uma perspectiva de direito comparado. Ele varia de país para país e mesmo dentro de cada um, de autor para autor.
Na Alemanha logo no inicio do sec. XIX, o conceito de acto administrativo assentava no postulado que sempre que a Administração actuasse fora do seu próprio âmbito ou em situações que envolvessem ingerência nos direitos de particulares, esta actuação tinha que ser fundada num acto jurídico passível de ser legalizado. Trata-se de um conceito globalizante e que ainda hoje impera na dogmática alemã. Parece no caso alemão não existir um diferença muito nítida entre os conceitos de acto administrativo stricto senso e o de acto administrativo impugnável.
No caso Francês é diferente, foi definido o conceito de decisão executória, que não se identifica plenamente com o conceito de acto administrativo, existia a distinção dentro do acto administrativo entre o que continha uma decisão executória e os que não continham, sendo que apenas o primeiro caso era um acto recorrível que podia ser objecto da fiscalização contenciosa da legalidade.
No caso Português o conceito de acto administrativo foi sendo construído numa base doutrinária e jurisprudencial. Marcello Caetano configurou-o num sentido amplo como: " Conduta voluntária de um órgão da administração que no exercício de um poder publico e para prossecução de interesses postos por lei a seu cargo, produza efeitos jurídicos".

Todavia ao lado deste conceito mais amplo, apareceu também o conceito restrito do acto administrativo executório, no sentido em que sempre que o acto administrativo define-se com força obrigatória geral direitos da administração ou dos particulares ou que estivesse em causa as suas relações jurídicas esse acto podia ser objecto de impugnação contenciosa. Começou assim então por ser definido o conceito de acto jurídico da administração numa perspectiva muito ampla, em que dentro de actos jurídicos da administração cabiam os regulamentos, os actos jurisdicionais e os actos administrativos. Freitas do Amaral proponha também um conceito amplo de acto administrativo, para este Professor tal acto deve ser entendido como:"acto jurídico unilateral, praticado por um órgão da Administração no exercício de um poder administrativo que visa a produção de efeitos jurídicos sobre uma decisão individual num caso concreto". Partindo do sentido amplo chega-se a definição do acto definitivo e executório onde assenta a garantia do recurso contencioso.

Nos dias de hoje a discussão não pode ser dissociada da definição que esta presente no art. 120 CPA que diz que só são actos administrativos: " as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta". Este preceito ao faz assim uma distinção entre os actos que tenham conteúdo decisório e aqueles que não o tenham, ou seja parece afastar-se da ideia do conceito amplo optando por um conceito muito mais restrito que não inclui todas as manifestações jurídicas unilaterais e concretas da Administração Pública. Ora partindo agora deste novo conceito restrito ficam de fora todos os actos com conteúdo não decisório, ou seja não será possível impugnar a generalidade dos actos preparatórios dos procedimentos administrativos, todavia este conceito de decisão deve ser interpretado de uma forma ampla, ou seja um acto jurídico contem uma decisão sempre que tenha em si mesmo uma declaração de vontade dirigida a determinar uma conduta a adoptar ou um resultado a atingir.

Acto administrativo pode então hoje ser definido como todos os actos jurídicos concretos com conteúdo decisório, e que resultem do exprimir de uma vontade por parte da Administração, no exercício da função administrativa, e que determinem o sentido de condutas a adoptar.

O art.51 CPTA vem dizer que apenas são impugnáveis os actos administrativos que tenham eficácia externa, especialmente os que sejam passíveis de direitos ou interesses legalmente protegidos, definição próxima do " acto administrativo definitivo e executório" dada por Marcello Caetano, acto esse que seria: " o acto de autoridade da Administração". Esta distinção é muito importante no sentido em que é necessário delimitar o universo dos actos administrativos que são recorríveis e saber se hoje o conceito de acto administrativo em sentido restrito contemplado no CPA coincide com o de acto administrativo impugnável. O âmbito do art. 120 exclui os actos jurídicos concretos da Administração que não possuem conteúdo decisório. Ora, elemento decisivo da noção de acto administrativo impugnável é a eficácia externa, com efeito, os actos que não afectam a esfera jurídica de ninguém, e que não se destinam a produzir efeitos externos, não podem ser impugnados por ninguém, nem sequer pelo Ministério Público, Só estes actos não são por isso impugnáveis a luz do art. 51 nº 1 CPTA, isto na opinião do Prof. Aroso de Almeida.

Numa visão um pouco diferente segue o Prof. Vasco Pereira da Silva, no sentido em que entende o critério da eficácia externa tão importante como o da susceptibilidade de lesão de direitos, e apresenta os dois como critérios autónomos para a impugnação de actos administrativos.

Em suma, o conceito de acto administrativo impugnável é mais vasto que o conceito de acto administrativo na medida em que não depende da qualidade do autor, inclui toda e qualquer decisão que contenha eficácia externa, ou seja decisões tomadas por entidades privadas que exerçam poderes públicos e também actos emitidas por entidades não integradas pela a administração tal como previsto no art: 51 nº 2 CPTA. E é mais restrito tendo em conta o critério da eficácia externa do acto, sendo que assim ficam em principio excluídos deste âmbito os actos internos nomeadamente os inseridos em relações inter-organicas ou intra-administrativas, com a excepção dos actos que embora inseridos em procedimentos administrativos sejam destacáveis e tenham conteúdo decisório, como as chamadas pré-decisões que visto terem capacidade de por elas próprias constituir efeitos externos são susceptíveis de impugnação, resolução semelhante devem ter também os pareceres vinculativos.

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