terça-feira, 16 de dezembro de 2008

A SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DOS ACTOS ADMINISTRATIVOS

O instituto de suspensão da Eficácia dos actos administrativos é definido pelo Professor Doutor Freitas do Amaral como sendo o meio processual acessório pelo qual o particular pede ao tribunal que ordene ineficácia temporária de um acto administrativo de que entrepôs ou vai entrepor-se recurso contencioso de anulação a fim de evitar os prejuízos que para o particular adviriam da execução imediata do acto.
Este instituto desempenha uma função instrumental que se traduz em assegurar a efectivabilidade prática da garantia que os particulares procuram obter para os seus direitos através do contencioso de Anulação.
O professor Cláudio Monteiro reconhece uma dupla função: por um lado, uma função instrumental em relação ao Juízo de fundo proferido na sentença final do mesmo, por outro lado, uma função substantiva do acautelamento dos direitos e interesses em presença.
O professor Mário Aroso de Almeida acrescenta ainda que a suspensão da eficácia dos actos administrativos é uma medida de alcance constitutivo, que antecipa embora a título provisório, os efeitos da sentença de anulação cuja utilidade prática visa acautelar.
Hodiernamente, a doutrina tem entendido que a suspensão se dirige globalmente à eficácia dos actos e não apenas à sua executoriedade. Deste modo, o objecto imediato da suspensão é os efeitos jurídicos do acto e não o próprio acto que assim surge como mero objecto mediato.

A problemática da suspensão de actos administrativos já executados:

Na generalidade dos países tributários do sistema administrativo de matriz francesa, quer a doutrina quer a jurisprudência pronunciavam-se pela impossibilidade de suspensão de actos já executados, por carência de objecto.
Mais tarde, passou-se a sustentar que a suspensão incide sobre os efeitos jurídicos em sentido estrito e não sobre a execução do acto como erradamente se defendia. Assim, a produção em concreto dos efeitos do acto não constitui entrave à invocação desta medida, salvo aquelas situações em que os actos sejam executados em termos materialmente irreversíveis, como por exemplo, no caso de demolição de edifícios. Fora estas situações, as restantes são passíveis de suspensão, mesmo depois de executadas.
O que se pretende com a suspensão é evitar que na pendência dos recursos se criem situações de facto incompatíveis com a eficácia repristinatória da sentença.
O legislador ao admitir a suspensão da eficácia dos actos já executados está a referir-se aos actos da execução instantânea porque desde sempre se entendeu possível a suspensão de actos de execução continuada, por os seus efeitos se prolongarem no tempo justificando-se que sejam neutralizados, pelo que desde que estivessem verificados os requisitos cumulativos é concedida a suspensão de tais actos.

O problema da suspensão dos actos nulos

A nulidade é a forma mais grave de invalidade de um acto administrativo na medida em que, um acto nulo não produz efeitos desde o início (artigo 133º CPA). Assim, um acto administrativo nulo não obriga os administrados que têm o direito de desobedecer, podendo até, oferecer resistência à sua execução.
Embora possa parecer um contra-senso falar-se em suspensão de actos nulos na medida em que estes não obrigam os administrados a verdade é que se verifica em relação a tais actos uma aparência de efeitos Jurídicos que podem ser muito relevantes.
O Professor Doutor Sérvulo Correia considera que nestas hipóteses não há executoriedade num plano Jurídico, mas a administração comporta-se como se houvesse. Tal circunstância constitui razão acrescida para o decretamento da suspensão de executoriedade “de facto”. Na verdade, a suspensão deveria ser facilitada pelo Tribunal, em virtude de não haver dano para o interesse público na paragem da execução de um acto que não produz efeitos desde o início.
No entanto, o STA embora considerando que o acto nulo seja susceptível de suspensão dada a sua aptidão para produzir efeitos lesivos tem entendido que para ser concedida a suspensão de tais actos é necessário que estivessem verificados todos os requisitos plasmados na lei, não acolhendo, desta forma às críticas na doutrina.

O problema da suspensão de actos normativos

Possuindo os actos normativos um conteúdo genérico o STA tem considerado que eles não são susceptíveis de provocar imediatamente efeitos lesivos na esfera jurídica dos particulares, em virtude de carecerem de um acto concreto de aplicação. Este entendimento não deve ser acolhido na sua plenitude na medida em que são idóneos para causar imediatamente lesões aos direitos e interesses legítimos dos particulares os denominados regulamentos imediatamente operativos ou exequíveis por si mesmo, prescindindo de um ulterior acto de aplicação.
Estes regulamentos imediatamente operativos funcionam como verdadeiros actos administrativos, pelo que não se vislumbram motivos para que o cidadão não beneficie de igual modo de um meio de tutela cautelar eficaz para a defesa dos seus direitos. As mesmas razões que levaram o legislador a prever a suspensão em relação a comportamentos ilegais da administração expressos através de um acto administrativo também devem valer em relação em relação a semelhantes comportamentos expressos através de actos normativos.

O problema da suspensão dos actos negativos

A Jurisprudência tem confinado o instituto aos actos de conteúdo positivo, isto é, aqueles actos que são susceptíveis de provocar prejuízos de ordem material na esfera jurídica dos particulares. Nesta medida os actos de conteúdo negativo são insusceptíveis de serem suspensos em virtude dos mesmos serem inaptos para produzir alterações nos status dos destinatários. Tem sido também entendido pela Jurisprudência que a ser admitida a suspensão de actos de conteúdo negativo isso traduzir-se-ia na violação do princípio da separação de poderes, uma vez que os tribunais estariam a envolver-se no exercício da administração activa.
O caso Oliveira Neiva constitui o único caso em que o Supremo Tribunal administrativo se pronunciou em sentido favorável ao pedido de suspensão de conteúdo negativo.
Esta orientação da Jurisprudência parece demasiado simplista e formal na medida em que dá o mesmo tratamento aos actos negativos propriamente ditos, e aqueles actos que a doutrina classifica como aparentemente negativos.
No geral, estes actos negam a confirmação de uma situação de vantagem atribuída por um acto administrativo anterior, produzindo o efeito material da cessação dessa situação de vantagem.
A finalidade da suspensão é a de evitar a consolidação de actos irreversíveis. Tendo em conta a idoneidade que os actos aparentemente negativos possuem para produzirem efeitos inovadores são susceptíveis de serem suspensos.

Suspensão provisória

Quando a suspensão se destine a tutelar direitos, liberdades e garantias que de outro modo não possam ser executáveis em tempo útil ou em casos de urgência, admite-se, que o Tribunal a possa decretar a título provisório desde que ouvidas as partes e sem prejuízo de poder decidir o seu levantamento ou alteração.

Consagração da garantia da suspensão

A decisão da suspensão da eficácia de um acto, ou de uma norma, nos termos do artigo 127 do CPTA pode ser objecto de execução forçada pelas formas previstas no código para processo executivo, em caso de não acatamento por parte da administração.


Posto isto, importa destacar como principais pontos relevantes que os actos normativos que produzam imediatamente os seus efeitos, sem intermediação de qualquer acto de aplicação, podem ser suspensos com efeito circunscrito ao caso de quem a requerer. Da mesma forma, todo o tipo de providências cautelares podem ser requeridas e adoptadas pela justiça administrativa desde que adequadas a assegurar a utilidade da sentença a produzir no processo principal.

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