terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Questão de arrumar a casa…

Convida-nos o Prof. Vasco Pereira da Silva a reflectir acerca da “arrumação” sistemática do artº37,nº2,al.c do CPTA, a propósito da sua inserção em sede de acção administrativa comum, para “ a condenação à adopção ou abstenção de comportamentos, designadamente a condenação da Administração à não emissão de um acto administrativo, quando seja provável a emissão de um acto lesivo”. Logo neste ponto se levanta uma questão: atenta a delimitação entre a acção comum e a acção especial, sendo esta aplicável a todas as situações em que estão em causa manifestações do poder público e em que a acção administrativa especial caracterizar-se pelo facto de se reportar à prática ou omissão de actos administrativos ou de normas, o artº37,nº2, al.c, não seria de ter a tramitação de uma acção especial? Dirigida contra a administração, este pedido de condenação redunda naquilo que é apelidado pela doutrina de acção inibitória ou impositiva.
Importada do direito alemão, esta figura assemelha-se à acção preventiva de abstenção, que é o meio processual apropriado para a tutela do direito à abstenção ou cessação de lesão por parte da Administração desde que a sua actuação não se consubstancie na emissão de actos administrativos impugnáveis, devendo entender-se o conceito de comportamento num sentido amplo, conforme assinala o Prof. Vieira de Andrade. Trata-se de um meio processual destinado a funcionar preventivamente , vocacionada para a protecção da integridade de direitos absolutos e de personalidade, em casos de ameaça de agressões legítimas, baseadas como observa o Prof. Mário Aroso de Almeida, na existência de fundado receio.

Problema que se coloca com alguma acuidade é a formulação da segunda parte do artigo. Ainda que a ratio do artigo seja a inibição de condutas da administração potencialmente lesivas para os particulares, o legislador terá por lapso (ou não) introduzido na letra do artigo a condenação à não emissão de actos administrativos. Não são estes actos apreciados em acção administrativa especial? Não será esta opção contraditória perante a distinção entre acção comum e acção especial? Não terá a acção especial transformado-se em comum ou vice-versa?
Cremos que a norma deverá ser interpretada no sentido de que o acto a que se refere ainda não foi efectivamente praticado, funcionando a lógica preventiva no sentido de impedir a sua entrada em vigor, recorrendo-se a uma interpretação sistemática e correctiva do preceito, no sentido de proposto pelo Prof. Vasco Pereira da Silva. Deste modo, a aplicabilidade do artº 37, nº2, al.c deve confinar-se aos casos em que o pedido de condenação à não emissão de actos administrativos futuros, i.e, aos casos em que a administração possa, eventualmente, através do seu comportamento, lesar direitos dos particulares, utilizando-se a forma de acção administrativa comum apenas nestas situações, a título residual, excepcional. De notar ainda que o efeito útil da utilização desta acção só pode ser alcançado quando o acto não tenha sido efectivamente praticado pela Administração bem como através da celeridade da actuação do tribunal na apreciação da questão, caso contrário esta transformar-se -À em acção de impugnação de actos.
Deste modo, somos partidários da posição sufragada pelo Prof.Vasco Pereira da Silva de que o meio processual mais adequado, de acordo com a lógica dicotómica utilizada pelo legislador para distinção entre os dois tipos de acção, seria a acção especial, apesar de o recurso a esta ocorrer apenas a título excepcional. Propomos então uma arrumação sistemática desta sub-acção dentro dos mecanismos da acção especial não esquecendo que a utilização da acção inibitória é feita em casos de excepcionalidade. Que solução encontrar, pese embora uma incoerência latente entre a opção de procedimentos diferentes para o mesmo problema ? Cabe então ao legislador procurar aperfeiçoar e compatibilizar os dois regimes,arrumando esta sub-acção dentro da acção adminitrativa especial, aplicando-se uma solução una para uma questão que se reporta a um mesmo problema(à condenação de actos), embora com objectivos diferentes, a fim de se evitarem mais actos falhados num contencioso que se quer de plena jurisdição.

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