quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Comentário à quinta tarefa

O contencioso administrativo português assegura a tutela jurisdicional dos direitos dos particulares através de diversos meios, entre os quais se destacam a acção administrativa especial (arts.46 e ss.CPTA) e a acção administrativa comum (arts.37 e ss.CPTA). Numa breve tentativa de distinção destes dois meios processuais pode dizer-se que o primeiro se dirige, basicamente, à impugnação de actos administrativos e à condenação da administração à prática dos mesmos. Por ser turno, a acção administrativa comum define-se por exclusão de partes uma vez que nela caberá tudo o que não cair no âmbito da acção administrativa especial. É neste contexto que se pode compreender a afirmação do Professor Vasco Pereira da Silva, quando se refere a esta como uma “acção-quadro” na medida em que se trata de um meio processual que encerra uma multiplicidade de pedidos.
É no âmbito da acção administrativa comum que surge a acção condenatória prevista no art.37/nº2, c) do CPTA, na modalidade relativa a pedidos de condenação à adopção ou abstenção de comportamentos. Nos termos deste preceito, o tribunal poderá condenar a administração à adopção ou abstenção de comportamentos e não de actos administrativos pois para tal seria adequada a acção administrativa especial e não a acção administrativa comum (não se podendo obter na acção administrativa comum aquilo que se obteria na acção administrativa especial). Assim sendo, os comportamentos a que se refere esta disposição reportam-se às actuações informais e técnicas e às operações materiais, nunca aos actos administrativos. Apesar disto, vem o art.38/nº1 CPTA regular a situação de, a título incidental, o tribunal poder conhecer de actos administrativos em acção administrativa comum. Contudo, segundo a orientação do Professor Vasco Pereira da Silva, estes actos serão concebidos enquanto simples factos jurídicos. Esta possibilidade faz todo o sentido se se entender que o contencioso administrativo deverá sempre privilegiar a relação jurídica administrativa subjacente a qualquer litígio, sem que possam existir limitações quanto ao conhecimento do tribunal de actos que não foram tempestivamente impugnados. De facto, não se pode considerar que o decurso do tempo seja um entrave à apreciação de actos administrativos quando esta se revele fundamental para que se possa alcançar a melhor solução numa relação jurídica administrativa e assim a concretização de um contencioso de plena jurisdição.
A questão que se coloca em relação ao pedido de abstenção de comportamentos previsto no art.37/nº2, c) CPTA diz respeito à segunda parte do preceito que parece entrar em contradição com a primeira parte do mesmo. Efectivamente, vem a primeira parte do artigo permitir que se condene a administração à abstenção de comportamentos (que não sejam actos administrativos). Todavia, na segunda parte o mesmo artigo refere a possibilidade de não emissão de actos administrativos, o que pareceria apontar para a utilização, quanto a este aspecto, da acção administrativa especial. Ora perante esta divergência, afigura-se como melhor entendimento, seguindo a linha de pensamento do Professor Vasco Pereira da Silva, proceder a uma interpretação sistemática do referido artigo. Em primeiro lugar, e como já foi mencionado, a condenação dirá sempre respeito a operações materiais e a actuações informais e técnicas, já que quando se trate de actos administrativos, o meio processual adequado será sempre a acção administrativa especial na modalidade de acção de condenação à prática de acto devido (arts.66 e ss. CPTA). Ainda assim, é possível conferir alguma utilidade à segunda parte do preceito em análise se se entender que a condenação à não emissão de acto administrativo é vista como algo de excepcional e somente em situações de que possam resultar agressões para os direitos dos particulares, ou seja, como uma tutela inibitória quando seja de prever que da emissão de um acto administrativo possa resultar uma lesão para um particular. Neste sentido, é admissível ainda, nos termos do art.112/nº2, f) CPTA, que seja decretada uma providência cautelar que vise justamente ressalvar o efeito útil da sentença, sendo que será necessário um “receio (juridicamente) qualificado da provável verificação de uma agressão dos seus direitos por um comportamento administrativo posterior”, (leia-se, dos direitos dos particulares) (Vasco Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, p.420). Estabelece-se assim, de acordo com as palavras do Professor Vieira de Andrade, uma tutela preventiva, de utilização em termos restritos, a que se poderá recorrer quando a acção administrativa especial se revele insuficiente por não assegurar uma protecção efectiva dos direitos dos particulares.
Ana Sofia Rodrigues, nº15098

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