segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Comentário à 3ª tarefa

A condenação à prática do acto devido constitui um dos tipos de pretensões que poderão ser deduzidas, a título principal, através da acção administrativa especial, e destina-se a obter a condenação da entidade competente à prática, dentro de determinado prazo, de um acto administrativo ilegalmente omitido ou recusado (assim, nos termos dos artigos 46º,nº2 e 66º nº1 do CPTA).

Trata-se de uma pretensão condenatória que tem em vista uma prolação de uma decisão judicial que imponha à administração a prática de um acto administrativo com um certo conteúdo, e que dá concretização prática, no plano do direito ordinário, ao imperativo resultante da revisão constitucional de 1997, que inclui na garantia de tutela jurisdicional efectiva dos administrados a determinação da prática do acto legalmente devido, nos termos do artigo 268º nº 4 da CRP.

Assim sendo, no contencioso administrativo a via adequada para reagir contra situações de recusa ou omissão ilegal da prática de actos administrativos é a dedução de um pedido de condenação da Administração à prática do acto pretendido. Pois, o processo de impugnação de actos administrativos só pode ser utilizado para se reagir contra actos de conteúdo positivo, ou seja, actos esses cujo conteúdo não se esgote na mera recusa de introduzir modificações jurídicas que tenham sido requeridas. Incluem-se, assim, nestes actos os actos de revogação cujo alcance é cessar os efeitos de actos administrativos anteriores e que só por si a anulação contenciosa faz todo o sentido na medida em que implica a repristinação do acto revogado.

Logo, o processo de impugnação deixa de ser a via adequada para reagir contra actos administrativos de indeferimento, tal como se retira do artigo 51º, nº 4 do CPTA. Subjacente a este artigo, está o reconhecimento de que não há razões atendíveis, que do ponto de vista da necessidade de tutela e do interesse em agir, daqueles que se dirigem a um tribunal administrativo para reagir contra um acto de recusa da Administração em satisfazer uma pretensão dirigida à prática de um acto administrativo que justifiquem a impugnação do acto de indeferimento. Contudo, o que o autor pretende é a prática do acto ilegalmente recusado, condenando assim a Administração à sua prática (será essa condenação desse acto que ele deverá pedir).

Não obstante, não havendo seguramente interesse em impugnar um acto de indeferimento, há excepcionalmente situações em que poderá existir uma necessidade de tutela que justifique a impugnação desses actos. Questão suscitada pela doutrina Alemã e que teve as seguintes conclusões:
-regra geral, não é possível a impugnação de actos administrativos de indeferimento, principalmente por falta de interesse e de necessidade de tutela (tal como se pode retirar do nosso artigo 51º, nº4 do CPTA);
-a titulo excepcional, será admitida a impugnação dos actos de indeferimento, com a condição de que o autor assuma justificadamente que não pretende obter o acto ilegalmente recusado, mas apenas o reconhecimento judicial de que o acto de indeferimento foi ilegal, e a sua retirada da ordem jurídica; admitindo-se assim que haja um interesse processual autónomo;

Efectivamente, tudo depende do que o autor pretenda. Em regra a solução mais correcta será o pedido de condenação à prática do acto devido, devendo o tribunal convidar o autor à substituição do pedido de anulação, nos termos do artigo 51º/4 do CPTA. Excepcionalmente, justificando o autor um interesse autónomo na anulação, assumindo fundamentalmente que não pretende obter o acto devido e bastando-lhe o reconhecimento da ilegalidade do acto de recusa, admite-se possível a impugnação do acto, mas consequentemente afasta-se a aplicação do artigo 51º/4 do CPTA, ou seja, o convite á substituição. Não obstante, terão de se preencher dois requisitos essenciais. Serão eles: deverá ser mostrado de modo convincente que da anulação do acto de indeferimento resulta para o autor uma utilidade que dá resposta à sua necessidade de tutela jurisdicional, por um lado; por outro, deverá também o autor demonstrar que essa utilidade é autónoma em relação à que resultaria da condenação à prática do acto devido.

Contudo, não está excluído de que um pedido de condenação possa estar associado à impugnação de um acto administrativo, admitindo-se assim a dedução cumulativa desses dois pedidos.
Efectivamente, dever-se-á conjugar a aplicação do artigo 51º/4 do CPTA com os artigos 66º e 67º alíneas a) e b) do CPTA, pois este meio processual destina-se a reagir contra situações de inércia administrativa que corresponde assim ao chamado indeferimento tácito (artigo 109º do CPA).
Conclui-se assim, que não está em causa uma violação ao princípio da separação de poderes, pois uma coisa é condenar a Administração outra completamente diferente é de praticar actos em vez dela. Condena-se a Administração á prática de actos administrativos devidos, decorrentes da preterição de poderes legais vinculados, o que corresponde à tarefa de julgar, outra coisa é o tribunal praticar actos em vez da Administração ou invadir o seu domínio de escolhas.

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