sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

2ª tarefa - uma questão de copo meio cheio ou meio vazio

Quanto à noção histórica de acto administrativo como ponto de partida para a noção de acto administrativo impugnável já muito foi aqui explanado, assim como a sua respectiva evolução pelo Estado Liberal, Social e Pós-Social, e as suas transformações internas e externas.
No que respeita à amplitude ou restrição do conceito de acto administrativo impugnável leva-nos à analogia do copo meio cheio ou copo meio vazio, pela ambiguidade presente na questão, e na querela doutrinária a que se assiste.

Na óptica do Prof. Vasco Pereira da Silva os actos administrativos impugnáveis abrangem uma noção muito ampla, não só as decisões administrativas finais que consolidam efeitos novos, mas acabando por alargar-se às decisões que acabam por lesar direitos de particulares, por actos intermédios, decisões preliminares ou simples actos de execução. O Prof. interpreta o artigo 120.º do CPA enquanto noção “ampla e aberta de acto administrativo, compreendendo toda e qualquer decisão destinada à produção de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta”.

Por seu lado, o Prof.Vieira de Andrade invoca o conceito de acto administrativo como uma decisão reguladora de autoridade própria do poder administrativo, que deve ser hoje entendido através de uma concepção restrita. De facto, o conceito de acto administrativo nos termos do art.120ºCPA abrange não só actos, mas todas as decisões que afectem a esfera jurídica dos particulares, como já foi referido. No entanto, na defesa pela amplitude, o Prof. invoca o art.51º/2CPTA, que numa dimensão orgânica, acabam por estar incluídos, não só decisões tomadas por entidades privadas que exerçam poderes públicos, como ainda actos emitidos por autoridades não integradas na Administração Pública. Por seu lado, o acto administrativo já exige a tradicional qualidade administrativa do seu autor, mais respectivamente órgãos da administração, conforme o disposto no art.120ºCPA. A defender a restrição do conceito, o Prof. Vieira de Andrade invoca que este abrange apenas as decisões administrativas com eficácia externa, podendo englobar-se actos inseridos num procedimento administrativo cujo conteúdo seja susceptível de provocar uma lesão ou de afectar imediatamente posições subjectivas de particulares. (art.51º/1 CPTA )



O que importa na questão da impugnabilidade é a susceptibilidade desses mesmos actos provocarem ou não uma lesão ou afectar imediatamente a esfera jurídica dos particulares, é este o pressuposto que acaba por ter defesa constitucional no art.268º/4 CRP no âmbito do acesso à justiça administrativa. Tal preceito ao estabelecer um direito fundamental de impugnação dos actos administrativos, e conferir ao recorrente pleno interesse em agir, é prova da função da Administração actual de natureza predominantemente subjectiva de garantir os direitos dos particulares.
Assim, o CPA adopta uma noção ampla de acto administrativo conforme o plasmado no art.120º e concretiza a impugnação de actos administrativos.

Se antes o acto para ser impugnado tinha de ser materialmente, horizontalmente e verticalmente definitivo e executório, e daí a necessidade da figura do recurso hierárquico, que se dispensa hoje ( acabando por se considerar inconstitucionais as disposições que o prevêem) , o critério adoptado pela Constituição e pelo novo Código para a mesma impugnação passa a ser o da aferição da lesividade do acto na opinião do Prof. Vasco Pereira da Silva. De acordo com o art.51º/1 CPTA exige-se a eficácia externa, actual ou potencial, pela a afectação da esfera jurídica do particular. Eficácia potencial desde que seja seguro ou muito provável que a virá a ter, sendo que a sua capacidade subjectivamente lesiva apenas virá colocar essa sua impugnabilidade sob a alçada da garantia constitucional.

Analisando jurisprudência recente que remete para a questão, conclui-se que esta garantia constitucional acaba por ser impositiva, mas não limitativa, o legislador ordinário tem que respeitar a impugnabilidade contenciosa dos actos lesivos, mas não decorre do preceito que apenas tais actos sejam impugnáveis junto dos tribunais. O CPTA veio consagrar, como princípio geral, que ainda que inseridos num procedimento administrativo, são impugnáveis os actos administrativos com eficácia externa, especialmente aqueles cujo conteúdo seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos (artigo 51º/1 CPTA).
Numa análise ao direito comparado, verifica-se a a tendência para o consecutivo alargamento da noção de impugnabilidade mesmo nos sistemas em que se tinha adoptado a noção restritiva da mesma.


Em suma, será de aceitar a amplitude do conceito de acto administrativo impugnável na óptica do Prof. Vasco Pereira da Silva, que como subjectivista dá primazia ao garante constitucional de protecção dos particulares, pois tal se torna defensável à luz das finalidades da Justiça Administrativa dos nossos dias. Assumido assim, uma perspectiva subjectivista e optimista de copo meio cheio ao defender os interesses e direitos dos particulares.

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